No passado, o paradigma de empresa era uma coleção de funções bem desenvolvidas e administradas, criando um padrão de “excelência operacional”. Como consequência, os produtos gerados eram os melhores possíveis, e bastava expô-los adequadamente que os clientes vinham. Para isso, criavam-se os manuais funcionais, que deviam ser obedecidos por todos, e durar para sempre. O sucesso dependia apenas de seguir à risca as instruções prescritas, e o trabalho gerencial era zelar pelo fiel cumprimento das prescrições.
Aos poucos, as coisas começaram a não funcionar mais assim. Daí surgiram todos os projetos de reengenharia do fim do século passado, que transformaram radicalmente o panorama empresarial. Entretanto, uma outra perspectiva, que foi negligenciada até agora, permite identificar algumas deficiências que não foram superadas. Entre elas:
- Os profissionais da empresa têm à disposição sofisticados sistemas de informação, mas não têm uma boa perspectiva do conhecimento existente na empresa. Eles estão limitados à informação que recolhem nos círculos que frequentam. Como consequência, a roda está continuamente sendo reinventada incluindo popads.
- A empresa está agora organizada por processos, visando a torná-la mais dinâmica, mas a flexibilidade das pessoas é próxima de zero. As atividades dependem das pessoas específicas e do seu conhecimento. A realocação de recursos, para refletir mudanças no mercado, praticamente inexiste.
- O ambiente favorece uma empresa em contínua evolução, mas o desenvolvimento pessoal é exatamente isso: pessoal, deixado por conta de cada um. Sem as ferramentas próprias, é impossível desenvolver alguém começando numa nova área – e menos ainda criar um amplo programa de educação.
- A competição global e crescente exige inovação e respostas rápidas às demandas dos clientes, mas os esforços conjuntos das várias áreas para desenvolver novos produtos e processos são lentos, dolorosos – e muito frustrantes.
Os recursos críticos: identificando o papel do conhecimento
Os projetos de reengenharia abordaram os processos, tornando-os ágeis e flexíveis. Mas a abordagem foi do ponto de vista de fluxos de informação, não de conhecimento. Cada vez mais, os fatores importantes para o sucesso empresarial são a análise dos mercados, as inovações que surpreendem os concorrentes, a gestão estratégica dos recursos, o marketing preciso, a excelência em serviços e a atenção ao cliente. Ou seja, o sucesso é resultado do conhecimento das pessoas, utilizando discernimento individual e trabalhando colaborativamente, com intenso apoio de tecnologia da informação. Não que processos ágeis e informações precisas não sejam importantes. É que não são mais suficientes.
Pessoas, conhecimentos e TI são os recursos estratégicos das empresas modernas. Mas embora muita atenção seja dedicada ao estudo de pessoas e de TI, o conhecimento como recurso empresarial é pouco estudado, e a gestão do conhecimento ainda é uma miragem distante em quase todas as empresas brasileiras. As empresas continuam medindo o sucesso de seus processos em toneladas, horas, metros e reais – sem identificar explicitamente a importância do conhecimento.
Por outro lado, os benefícios que se podem esperar de gerir o conhecimento como recurso são muitos e – surpreendentemente, para algumas pessoas – fazem perfeito sentido como objetivos de negócio, resultando certamente em vantagem competitiva. Os principais benefícios são:
Eficiência: Aumentar a produtividade e reduzir os custos, com a rapidez e facilidade de acesso ao conhecimento; reduzir a redundância no trabalho (não reinventar a roda);
Eficácia: Apoiar e acelerar o desenvolvimento de inovações;
Desenvolvimento: Permitir a criação de programas de desenvolvimento eficazes e mudanças rápidas na alocação de recursos;
Motivação: Aumentar a satisfação dos profissionais, permitindo maior autonomia e maior desenvolvimento pessoal;
Proteção de Ativos: Proteger e reduzir as perdas de capital intelectual quando as pessoas deixam a empresa;
Gestão de Ativos: Apoiar a gestão do conhecimento como ativo principal ou, pelo menos, crítico da empresa.
Tomando uma atitude: implementando a gestão de conhecimento
Gestão do conhecimento é um conjunto de processos, apoiados por ferramentas de TI, voltados a capturar, organizar, armazenar, proteger e – sobretudo – compartilhar o conhecimento das pessoas, sob suas duas formas: conhecimento explícito (dados e informações) e conhecimento tácito (habilidades e experiência). A implementação da disciplina empresarial de Gestão do Conhecimento lidará com as deficiências mencionadas, complementando a transição iniciada pela reengenharia, trazendo às empresas a capacidade de alavancar o conhecimento das pessoas através de TI.
A implementação da gestão do conhecimento é um programa que enfrenta difíceis barreiras organizacionais. Primeiro, conhecimento é um assunto complexo, que envolve uma grande dose de subjetividade. Segundo, até que a gestão de conhecimento comece a contribuir para o trabalho das pessoas, todos na organização têm que gastar um tempo extra com o assunto. Depois, e isso é o mais complicado, as pessoas pensam que após ter “extraído” seu conhecimento, a organização não vai mais precisar delas, e resistem a se envolver. Por isso, o programa deve começar com um objetivo específico e limitado, visando a diminuir o número de pessoas (e o volume da resistência) envolvidos, atingir o objetivo a curto prazo e conseguir um efeito de demonstração, que servirá para estender a amplitude de ação. Um projeto típico tem os seguintes passos:
Identificar um problema: identificar um processo específico no qual administrar o conhecimento envolvido possa fazer a maior diferença. Pode ser em suprimentos, produção, vendas, finanças ou qualquer outra área;
Começar a mudança: sensibilizar o público-alvo para o projeto, sensibilizar toda a organização para a nova disciplina, projetar e iniciar o processo de gestão da mudança, que acompanha o projeto em todas as suas etapas até o final;
Mapear o conhecimento: usando metodologias e ferramentas de TI próprias, mapear o conhecimento. O mapa do conhecimento identifica todos os objetos de conhecimento envolvidos e seus relacionamentos (as “coisas” e as relações entre elas), criando uma taxonomia do conhecimento no domínio específico do problema. Esse mapa permite a criação da estrutura (vazia) de um repositório (base de dados) que receberá o conhecimento;
Criar o repositório de conhecimento: usando técnicas de interação e ferramentas de TI apropriadas, “povoar” o repositório com conhecimento específico. Essa é a parte mais delicada, pois consiste em “extrair” o conhecimento das pessoas;
Criar acesso: definir processos que levem as pessoas a capturar, organizar, armazenar, proteger e compartilhar o conhecimento como parte normal do seu processo de trabalho.
Medir o resultado: após o novo processo ter sido implantado (e absorvido), medir os novos resultados do processo, refletindo a contribuição da gestão de conhecimento.
O objetivo empresarial das empresas modernas é ainda atingir excelência operacional no uso de recursos – desta vez, de um recurso muito mais nobre e estratégico.