COVID-19 PODE SER CONSIDERADA DOENÇA OCUPACIONAL?
Com o surgimento de uma pandemia no país, diversas são as consequências, nos mais variados âmbitos da sociedade brasileira. Há problemas econômicos, sanitários, políticos e de diversos outros segmentos. No campo trabalhista e previdenciário não é diferente. Diversos trabalhadores se preocupam com a possibilidade de contaminação pela covid-19, sobretudo no momento de pico da doença no país, com transportes públicos lotados e desrespeito aos decretos municipais de capacidade reduzida dos estabelecimentos comerciais.
No campo previdenciário, a relevância se infere por meio da possibilidade de concessão de benefícios por incapacidade e até mesmo pensão por morte. Como intersecção entre esses temas, tem-se a possibilidade de consideração da covid-19 como doença ocupacional, trazendo-lhe diversas implicações.
No início da pandemia, em março de 2020, o Governo Federal editou a Medida Provisória n° 927, de 22 de março de 2020, segundo a qual os casos de contaminação pela covid-19 não seriam considerados doenças ocupacionais, salvo se houvesse efetiva comprovação de nexo causal entre o trabalho e a contaminação pela doença. No entanto, o Supremo Tribunal Federal – STF imediatamente suspendeu a eficácia desse dispositivo legal, sob o fundamento de que cabe ao empregador tomar as medidas cabíveis para que o empregado não seja contaminado, bem como representaria grande dificuldade para os trabalhadores comprovar esse nexo causal.
Assim, na verdade, a covid-19 poderia ser considerada doença ocupacional, e caberia aos empregadores comprovarem a adoção de todas as medidas cabíveis de proteção à saúde de seus funcionários para não serem responsabilizados. Logo depois, a MP não foi transformada em lei e seu conteúdo perdeu a vigência.
Em dezembro de 2020, de outro modo, o Governo Federal emitiu nota técnica afirmando que é possível reconhecer a covid-19 como doença ocupacional, aplicando-se-lhe todas as implicações que dessa conclusão derivar. No entanto, determinou a necessidade de realizar de perícia médica oficial, a fim de analisar a situação específica do trabalhador e constatar se houve ou não nexo causal entre a contaminação e o exercício da atividade profissional. Com isso, o Governo Federal excluiu qualquer presunção de veracidade das alegações do trabalhador no sentido de ter se contaminado no trabalho.
Por sua vez, o Ministério Público do Trabalho, no uso de suas atribuições, determinou que seja emitido o CAT, que é a comunicação de acidente de trabalho, todas as vezes que um funcionário se contaminar pela covid-19, ou mesmo se precisar ser afastado devido à suspeita clínica. O posicionamento desses órgãos, ainda que por meio de notas técnicas, que não possuem poder normativo, demonstram as grandes chances de reconhecimento da covid-19 como doença ocupacional.
Percebe-se, entretanto, que a caracterização desse reconhecimento dar-se-á de maneira particular, caso a caso, sendo necessário analisar a forma e as condições em que o trabalhador exerce sua função, a adoção das medidas de prevenção da contaminação pelo empregador e, em alguns casos, até mesmo a realização de perícia técnica no ambiente de trabalho.
As principais implicações do reconhecimento da covid-19 como doença ocupacional são as vantagens que ela traz ao trabalhador. A primeira delas é a inexigibilidade de carência para concessão de diversos benefícios, entre eles o auxílio por incapacidade temporária.
Enquanto situações de doenças comuns exigem doze meses de contribuição para requerimento do antigo auxílio-doença, caso se comprove que a doença é ocupacional, não haverá necessidade de cumprimento de doze contribuições previdenciárias. Outra vantagem está no cálculo do benefício, já que o auxílio por incapacidade temporária acidentário possui regras mais benéficas.
Outra considerável vantagem para o trabalhador é que, mesmo durante o período de afastamento, o empregador não poderá cessar o recolhimento mensal do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. Desse modo, o depósito patronal de 8% ao mês na conta do fundo não deverá ser cessado, o que certamente trará maior conforto financeiro para o empregado caso seja despedido injustificadamente no futuro. Por fim, outra grande vantagem para o trabalhador acometido de doença ocupacional é a estabilidade provisória no emprego: esse funcionário não poderá ser demitido durante o período de doze meses após o seu retorno ao trabalho, salvo em hipóteses de demissão por justa causa.